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Monumento em memória das vítimas venezuelanas

 Na proximidade de uma base militar coloca sempre em perigo a segurança das gentes. De facto, em épocas de paz, mas sobretudo em tempos de guerra, as instalações da tropa constituem os alvos privilegiados dos ataques, das sabotagens e dos atentados. Além disso, o próprio carácter dos aquartelamentos representa por si só um risco, decorrente do armazenamento de armas, munições e combustíveis. Porém, da 2ª Guerra Mundial até os conflitos do Médio Oriente, a utilização da base das Lajes nunca redunda em sacrifício da população, talvez pelo exercício de uma função de rectaguarda, distante dos cenários de efectiva contenda. No entanto, à margem das operações militares, o movimento das aeronaves em manobras de descolagem, aproximação e aterragem também acresce a probabilidade dos acidentes. Neste caso, a tradição regista uma série de despenhamentos no perímetro da freguesia, mais frequentes nos primórdios de aeródromo, quando a conjugação do menor aperfeiçoamento dos aviões com a maior exigência da guerra suscita a falha dos materiais. Nas últimas décadas, escasseiam felizmente os desastres, embora alguns permanecem bem vivos na memória do povo. Muito recentemente, em 1998, todos recordam a queda de um aparelho búlgaro, fretado pelos CTT, no cimo da Serra de Santiago, bem à vista da pista principal. Todavia, a maior tragédia ocorre em 1976, aquando do embate de um Hercules C-130 da força aérea venezuelana nos brejos do Lajedo, que causa a morte a todos os elementos do Orfeão da Universidade Central de Caracas, no começo de uma desejada digressão à Europa.

O desastre do avião venezuelano sucede na noite de 3 de Setembro de 1976, cerca de 22 horas, eventualmente determinado por condições atmosféricas adversas, resultantes da influência do furacão “ Ammy”. O despenhamento acontece no lugar do Lajedo, nas proximidades de sobrevivência. Assim, perecem muito naturalmente todos os 68 ocupantes, isto é, os membros da tripulação e os componentes do orfeão universitário de Caracas. A tragédia provoca uma consternação geral, de pesar pela morte de muitos jovens, que enterram sonhos de esperança em brejos de impiedade, e de receio pela consciencialização de um perigo comunitário, que constitui uma ameaça permanente. Aliás, a comiseração apodera-se inclusivamente do proprietário do terreno do infortúnio, Manuel Mendes de Sousa, morador na vizinha freguesia das Fontinhas. Com efeito, ordena a celebração de 20 missas por alma dos mortos, utilizando parte da indemnização auferida, considerada muito superior aos danos provocados no prédio, um mato de pouca utilidade. A sucessão das homenagens em memória das vítimas representa uma prova da dimensão e do significado do infortúnio, que cala fundo no coração das gentes.

De facto, volvidos apenas seis meses sobre a ocorrência da desgraça, registamos a organização da principal evocação, no seguimento de uma gestão eclesiástica e de um empenho da Junta de Freguesia, que move os necessários apoios da Câmara Municipal da Praia da Vitória e dos comandos militares português e norte-americano. Neste caso, o alargamento da via de acesso ao local do sinistro, curiosamente adquire a designação de Caminho do Avião, e a construção de um pedestal encimado por uma cruz culminam no cerimonial da tarde de 5 de Março de 1977. Na ocasião, perante um ajuntamento de cerca de 5000 pessoas , o bispo D. Aurélio Granada Escudeiro preside à Eucaristia, celebrada na presença do cônsul – geral da Venezuela em Portugal, que ressalta entre o grupo das autoridades. Mais recentemente, em 26 de Novembro de 1993, anotamos outra rememoração de profundo sentido, quando o novo Orfeão da Universidade Central de Caracas ruma até às Lajes, no propósito de prestar veneração ao espírito dos colegas infortunados. Desta vez, programa inclui a celebração de uma missa na paroquial de S. Miguel Arcanjo e uma visita ao lugar da desventura, para o descerramento de uma lápide, que assinala para a posteridade o drama dos orfeanistas venezuelanos. Por fim, em Setembro de 1996, à passagem de 20º aniversário, decorre um ritual semelhante, nomeadamente um acto religioso na Igreja e uma romagem ao pedestal, onde se procede à colocação de nova placa evocativa. Na mesma altura, a convite de entidades venezuelanas, o Pe. Francisco Dolores, cooperador das Lajes ao tempo do acidente de 1976, desloca-se a Caracas, participando em manifestações litúrgicas alusivas ao desastre. À beira de se completarem, em 3 de Setembro de 2001, 25 anos sobre o despenhamento do Hércules C-130 no Lajedo, é bem de crer que a recordação do desastre origine de novo a exteriorização da reverência dos lajenses.

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Aspeto do acidente aéreo no Lajedo, 1976